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16
maio
10

Hiragana e a literatura

A necessidade de expressar livremente os sentimentos do povo japonês impulsionou a escrita e a literatura da Era Heian, dominada pelas grandes mulheres
Por que surgiram os fonogramas hiragana e katakana?
Os japoneses não conheciam a escrita até ter os primeiros contatos com a cultura chinesa, por volta do século V. À medida que os japoneses foram dominando a escrita (kanji ou ideogramas), a língua e a literatura chinesas, eles começaram a sentir as limitações de se adotar essas formas de comunicação de um outro povo. Assim, para atender à necessidade de expressar livremente os sentimentos do povo japonês por escrito, foram criados os fonogramas hiragana e katakana, elaborados a partir do kanji.


Origem de Man’yôgana
Durante muito tempo, os japoneses liam os kanji à moda chinesa e tentavam entender o significado de cada letra, já que os kanji são ideogramas, ou seja, a transcrição da idéia e não do som, como é o caso da maioria das letras existentes. Pouco a pouco, os japoneses passaram a escolher a palavra adequada para cada kanji e lê-lo à moda japonesa. Por exemplo, o kanji que significa inverno é , sendo a leitura chinesa “dong”; porém, como em japonês inverno se diz “fuyu”, o kanji passou a ser lido “fuyu” também.

À medida que as palavras japonesas também foram filtradas e unificadas, os japoneses tiveram a idéia de transcrevê-las aproveitando apenas o som, ou seja, a sua leitura, desprezando a idéia ou o significado do kanji. Por exemplo, “hana” (flor – ) passou a se escrever também , já que tem a leitura “ha” e , a leitura “na”. Esses ideogramas (kanji) empregados apenas como fonogramas receberam o nome de man’yôgana, já que foram utilizados na transcrição dos poemas japoneses reunidos na antologia intitulada Man’yôshu.


Criação do hiragana
A caligrafia empregada deixou de ser letras de traços retos e definidos, adotando o estilo cursivo, o chamado sôsho-tai, criado na China. Porém, no Japão, o estilo foi adquirindo características próprias, “simplificando” de tal forma os kanji a ponto de ficarem bem diferentes das letras originais. Desse estilo cursivo “simplificado”, nasceu o hiragana. Assim, o hiragana é um conjunto de letras mais curvilíneas.


Criação do katakana
Assim como o hiragana, o katakana também foi criado a partir dos kanji, mas possui características diferentes. O katakana surgiu como sinais gráficos para auxiliar na leitura de textos chineses, ou ainda, para serem inseridos nos poemas ou textos em estilo chinês, a fim de facilitar sua leitura e compreensão. Essas “letras complementares” ofereceram aos japoneses uma maior expressividade, já que podiam escrever com maior desenvoltura até diferenças delicadas e nuanças dos sentimentos.

O katakana foi criado com base em uma parte dos kanji, por isso seus traços são mais retos e rígidos.

O uso tanto do hiragana como do katakana consolidou-se no início do século X, em meados da Era Heian, e são empregados até os dias de hoje, concomitantemente com os kanji.


A literatura em kana = literatura da nobreza
Após a criação dos fonogramas kana, a literatura entre os nobres conheceu o seu apogeu, constituindo a era áurea dos waka – poemas japoneses. Esses poemas que enaltecem a natureza, as diferentes facetas das quatro estações e os elementos da natureza foram criados graças à existência dos kana. O modo de expressão dos poemas contribuiu muito na formação da consciência estética dos japoneses. Nos palácios do imperador e dos nobres, as reuniões para compor e apreciar os poemas tornaram-se cada vez mais freqüentes, deixando de ser apenas um simples passatempo das mulheres. Saber compor poemas tornou-se um importante requisito para manter um convívio social entre os nobres da corte. A falta de interesse pela política ocorreu na mesma proporção em que se ampliou o círculo literário da nobreza.


Obras clássicas
O Tosa nikki (Diário de Tosa) foi escrito por volta do ano 934, por Ki-no-Tsurayuki e incentivou muitas mulheres a escreverem diários, estimulando a criação de muitas literaturas do gênero.

Genji-Monogatari (Contos de Genji), escrito por Murasaki-Shikibu, por volta do ano 1001, é conhecido como uma obra literária clássica de maior volume. Descreve a elegante e requintada vida da corte, os sentimentos do personagem principal, Hikaru Genji, em relação às mulheres com quem se envolve e as intrigas pelo poder. Não se trata de uma simples ficção, mas se observa a preocupação de descrever os usos e costumes, assim como os pensamentos da Era Heian.

Makura-no-sôshi é uma crônica escrita por Sei-Shônagon sobre a vida na corte, que descreve de forma vivaz, com sensibilidade aguçada e com genialidade, os hábitos do cotidiano da corte.

Kokin Waka-shû é uma antologia de 20 volumes que reúne 1.100 poemas compilada por ordem imperial (chokusen-shû), datada do ano de 905.


Rivalidade entre duas literatas
Tanto a autora de Genji-Monogatari, Murasaki-Shikibu, como a de Makura-no-sôshi, Sei-Shônagon, pertenciam à classe média da nobreza e serviram à família imperial na mesma época. Foram duas mulheres que lideraram as tertúlias realizadas na corte. Sei-Shônagon possuía gênio forte, fazendo questão de exibir o seu talento. Murasaki-Shikibu, uma mulher mais recatada e retraída, escreveu críticas severas em relação a essa atitude “exibicionista” de Sei-Shônagon em seu diário.

Por serem os poemas a forma de literatura mais valorizada na Era Heian, as obras dessas duas mulheres, mesmo conquistando muitos leitores, ficaram relegadas a um segundo plano, encaradas como um passatempo de mulheres da corte. Ainda assim, a literatura da Era Heian floresceu graças às grandes mulheres.

15
jan
10

zou-tanuki (“texugo, comprador de saquê”).

No Japão é comum encontrarmos na entrada de algumas lojas um gracioso animal – o tanuki. Sua presença indica que naquele estabelecimento é vendido o saquê e outros tipos de bebidas alcoólicas. 

Feito de cerâmica, ele pode ser encontrado em todos os lugares, mas é um pouco mais difícil de se deparar com o verdadeiro animal. O tanuki é uma criatura de pernas curtas, razoavelmente corpulenta, com um pequeno e espesso rabo, e é membro da família dos caninos. Embora o nome do tanuki em inglês seja ‘cachorro raccoon’, ele é freqüentemente confundido com o texugo japonês, anaguma, um animal completamente diferente.

Foi desde o início da Era Edo que a população passou a consumir o saquê refinado. Nessa época, os adultos mandavam as crianças aos Sakaya (lojas de bebidas alcóolicas) e essas retornavam à sua casa com uma garrafa de saquê (tokkuri). Antigamente, os produtores de saquê de Nada (região de Hyogo) diziam “Sem a presença de um texugo pequeno, não é possível fabricar um saquê delicioso!!!”. Segundo este ditado, para produzir um saquê de qualidade é necessário tradição e experiência. Assim, foi criado kozou-tanuki. Desde então, o Tanuki passou a ser visto também como um amuleto de sorte.

Folclore:

No folclore japonês, o Tanuki possui grande força física, e poderes sobrenaturais, incluindo poder de transformação e, assim como a raposa vermelha, chamada kitsune , é um mestre do disfarce que utiliza para iludir ou irritar as pessoas.

É uma criatura travessa, utilizando todas as formas de disfarces para iludir ou perturbar os viajantes. Posicionando-se em pé na calçada com suas patas traseiras, ele distende sua barriga (ou melhor, região pélvica), e bate nela com suas patas dianteiras. O tanuki também é simbolizado numa forma semelhante a uma raposa, fazendo brincadeiras loucas, perigosas e de mau gosto com sua enorme barriga, que mede oito tapetes de tatami!

Devido à sua pança, o Tanuki é associado com duas outras figuras que possuem grandes estômagos, o peixe Fugu (Baiacú), e Hotei, o gordo, Deus da Sorte. Também é dito que ele tem alguma ligação com a chaleira, por causa de sua aparência. O Shogun, Ieyasu Tokugawa, era irreverentemente referido como Furu Tanuki, velho Tanuki. A expressão ‘Tanuki-gao’ é às vezes utilizada para descrever mulheres de rosto redondo. No Japão dos dias de hoje então, você freqüentemente vê a estátua de um Tanuki do lado de fora de uma loja ou restaurante, sinalizando aos clientes que venham visitar o estabelecimento.

As suas oito características peculiares são conhecidas como “hassou engi” (cada característica associada a uma lição):

1- O chapéu japonês de bambu do kozou-tanuki significa proteção contra desastres inesperados.

2- Os olhos grandes significam a decisão certa.

3- A expressão amorosa do kozou-tanuki diz para nunca esquecer o sorriso no rosto.

4- A garrafa de saquê significa que esforço do dia-a-dia resulta nas virtudes que cada um possui.

5- O livro significa valorização da confiança e importância da caderneta financeira(o sucesso financeiro). No livro há um símbolo  hachi (kanji de 8). Este símbolo, brasão da família Owari Tokugawa, significa seu domínio sobre Owari-hachi-gun. Na epoca, Tokugawa Ieyasu tinha o apelido de ”Tanuki”  e, por isso, a introdução do brasão no livro foi aceito com grande sucesso.

6- A barriga saliente significa serenidade e equilíbrio para tomadas de decisão.

7- O saco com dinheiro expressa capacidade de aumentar riqueza e sabedoria para utilizar o dinheiro sem desperdícios.

8- O formato da cauda do texugo (cauda grossa com ponta afinada) significa que as tarefas que foram iniciadas devem ser executadas firmemente até a sua conclusão.

Essas estátuas são vendidas em lojas, e os tanuki geralmente são representados segurando uma garrafa de saquê e, como uma amostra do ácido humor japonês, com testículos exagerados. Acreditam que esses testículos (chamados coloquialmente de kintama – literalmente, “bolinhas douradas”) são símbolos de boa sorte.

 

O Animal original:

No passado, ele era caçado no Japão pela sua carne, sua pele marrom e preta (utilizada para fazer pincéis), e seus ossos, aos quais eram atribuídas qualidades medicinais. Eles foram introduzidos nas partes ocidentais da antiga U.S.S.R. para o cultivo de peles. Alguns escaparam (ou foram soltos), e desde os anos 50 espalharam-se pela Escandinávia e sul, chegando até na França.

Eles vivem em áreas altamente arborizadas, geralmente próximo à água, alimentando-se de invertebrados, pequenos animais (sapos, lagartos, roedores e pássaros que vivem ou constroem seus ninhos no chão) e (particularmente no outono), sementes e frutas silvestres. Quando vivem próximos ao mar, os tanukis também procuram comida ao longo da linha da maré, buscando caranguejos e outros animais marinhos que ficam expostos. Eles são mais ativos após o pôr do sol, e ao longo do anoitecer, depois novamente nas primeiras horas da manhã, período no qual eles podem chegar a vagar por 10 a 20 km, em busca de comida.

Como os tanukis entraram em áreas suburbanas e até urbanas no Japão durante os anos 80 e 90, começaram a procurar comida em aterros de lixo, e chegam até a ser alimentados por pessoas, em seus jardins, que é uma das razões que fazem com que eles sejam associados aos texugos, que sobrevivem nos aterros de lixo de muitas cidades. É improvável que você veja um tanuki durante o inverno porque, embora ele não hiberne, acumula gordura no outono e então recolhe-se à sua toca, desde novembro até meados de abril. Ele pode surgir algumas vezes para se alimentar, e nos períodos mais quentes, pode chegar a ficar sem dormir.

O futuro do Tanuki é incerto, já que muitos tanukis têm sido afetados pela ‘sarcoptic mange’, uma condição causada por um parasita. Os tanukis que contraem esse parasita sofrem deterioração de pele, e progressiva perda de pêlo, deixando-os parcialmente, ou completamente, sem pêlos. Nesse estado, a probabilidade que eles sofram e morram de hipotermia aumenta enormemente, e desde por volta de 1990, muitos têm sido encontrados mortos durante o inverno. Ao que parece, o parasita conseguiu espalhar-se de áreas suburbanas com altas densidades de tanukis até áreas selvagens também, levando a sérios declínios particularmente nas populações dos estados de Kanagawa e Miyagi. Durante o final dos anos 80 e início dos anos 90, o parasita espalhou-se rapidamente, e os números de animais infectados aumentaram bastante.

Por outro lado, os números de caçadores no Japão decaíram durante os anos 80, e num período de 10 anos, o número de tanukis mortos por caçadores caiu pela metade, de um pico de aproximadamente 75,000 em 1981, para aproximadamente 33,000 em 1990. Isso pode, de alguma forma, estar contrabalanceando o efeito do mange sobre a população de tanukis durante os últimos vinte anos.

23
abr
09

Viagem aos templos japoneses

Conheça os lugares sagrados que contam a história do Japão

por Yayoi Wada
03.01.2006

Fonte: revista made in japan

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0103_templo_02.jpgNos templos xintoístas, é possível presenciar os rituais realizados pelos sacerdotes, especialmente no oshougatsu, o Ano-Novo japonêsEspalhados por todo o arquipélago japonês, os templos são mais que uma expressão do xintoísmo e do budismo, as duas maiores religiões do país. Presentes tanto na agitação dos grandes centros urbanos, como Tokyo, quanto nas ilhas paradisíacas, como Miya-jima, os cerca de três mil templos japoneses são símbolos da cultura e da identidade nacional.

Uma das maiores manifestações populares do país é o hatsumode, a primeira visita do ano a um templo budista ou xintoísta, que acontece no Oshogatsu, o Ano-Novo japonês. Na primeira semana de janeiro, os templos ficam lotados de pessoas que fazem ora­ções para garantir saúde e sorte para o ano todo. Além do aspecto religioso, os templos também são pontos turísticos importantes, pois revelam a riqueza da arqui­tetura e arte japonesas. Conheça a seguir templos que, pe­la cons­trução única e beleza, con­­tam a história do Japão.

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Acima: o templo Todai-ji, em Nara; uma japonesa reza no oshougatsu; fiéis visitam o templo de Asakusa, em Tokyo; e multidão se aglomera para fazer orações no dia 1º de janeiro

Herança histórica

Fonte: Organização Nacional de Turismo JaponêsO templo xintoísta de Yasaka, um dos mais belos de KyotoO templo xintoísta de Yasaka, em Kyoto, é um exemplo remanescente de 1868, época em que xintoísmo e budismo andavam juntos. Um portal em estilo budista com dois andares guarda a entrada do templo em vez dos habituais toriis. Uma das maiores atrações do templo ocorre em julho, quando Yasaka abriga o festival de Gion, um dos mais belos espetáculos de Kyoto, surgido no século 14 para purificar e livrar a população do calor e umidade do verão.

Como chegar

Endereço: Kyoto-shi Higashiyama-ku Gionmachi Kitagawa 625

Telefone: (00xx81) 075-561-6155

Acesso: 8min a pé da estação Kawaramachi, da linha Hankyu

Horário: das 8h às 18h

Entrada: gratuita

Espetáculo sobre o mar

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O torii situado em pleno mar, em meio à na­tureza deslum­brante da ilha de Myia-jima, faz do templo Itsu­kushima um dos mais belos do país. Desde o século 6, divindades mari­nhas eram veneradas no local, mas foi somente em 1168 que o templo ganhou todo seu esplendor. Itsukushima é chamado de templo flutuante porque, à noite, seus corredores suspensos ficam iluminados por lanternas, em um espetáculo incomum. A maioria dos turistas fica apenas metade do dia na ilha. Sorte daqueles que pernoitam no local, pois podem aproveitar um visual quase místico.

Como chegar

Endereço: Hiroshima-ken Saiki-gun Miyajimacho 1

Telefone: (00xx81) 0829-44-2020

Acesso: de Hiroshima, é possível chegar à ilha de ferry por 1,4 mil ienes

Horário: das 6h30 às 18h

Entrada: 300 ienes

Buda gigante

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Imponente, o templo de Todai-ji foi cons­truído em 745, pelo im­perador Shomu. Apesar de atual­mente restarem apenas dois terços do original, o Todai-ji ainda é consi­derado a maior construção em madeira do mundo. O grande portão sul do templo, Nandai-mon, é guardado por dois deuses, cada um com 7 metros de altura. No hall prin­cipal, está a ima­gem de Ru­shana Buddha, o Daibutsu, a maior estátua em bronze do Japão, que foi recons­tituída inú­meras vezes por cau­sa de terre­motos e incên­dios, mas ainda impressiona.

Como chegar

Endereço: Nara-ken Nara-shi Zoushicho 406-1

Telefone: (00xx81) 0742-22-5511

Acesso: 15min a pé da estação de Nara, da linha Kintetsu

Horário: das 7h30 às 17h30

Entrada: 400 ienes

Monumento restaurado

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Construído em 1895, o templo Heian Jingu homenageia dois imperadores: Kammu, o responsável pelo estabe­leci­mento da capital de Heian, e Komei, o últi­mo imperador a governar da cidade de Kyoto e que, em 1938, após um movimento popular, passou a ser reve­renciado no templo xintoísta. Em 1940, o Heian foi restaurado, e, em 1979, passou por novas reformas. Hoje é um dos pontos turísticos mais importantes de Kyoto. O estilo chinês da cons­trução chama a atenção dos turistas, com grandes halls em laranja e branco.

Como chegar

Endereço: Nishi Ten-o-cho, Okazaki, Sakyo-ku, Kyoto 606-8341

Telefone: (00xx81) 075-761-0221

Fax: (00xx81) 075-761-0225

Acesso: 10min a pé da estação, pelo metrô Higashiyama, ou de ônibus, em direção a Higashioji-dori

Horário: das 8h30 às 16h30

Entrada: gratuita

Templo das Águas

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Um dos templos mais visitados de Kyoto, o Kiyomizudera chama a atenção por possuir uma plataforma de ma­deira que fica sus­pensa sobre um vale. Sua cons­trução é bastante antiga, datando de 778, quando um monge visio­nário encon­trou uma fonte de águas claras, kiyomizu. Até hoje, acredita-se que a água da cachoeira de Otowa, que corre no tem­plo, pode curar doenças. Uma atra­ção pró­xima ao tem­plo budis­ta é o Jishu-jinja, um tem­plo xintoísta fa­moso entre na­morados que querem tes­tar seu amor.

Como chegar

Endereço: Kyoto-shi Higashiyama-ku Kiyomizu

Telefone: (00xx81) 075-551-1234

Acesso: as paradas de ônibus próximas são Kiyomizu-michi ou Gojo-zaka, na avenida Higashi-oji-dori

Horário: das 6h às 18h

Entrada: 300 ienes

Estilo grandioso

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Localizado em Nikko, cidade turística próxima a Tokyo, o templo de Toshogu foi cons­truído no século 15, atendendo a um pedido feito em tes­tamento por Tokugawa Ieyasu, o primeiro xogum e unificador do Japão, morto em 1616. A construção teve início no ano seguinte, mas Iemitsu, o terceiro xogum do clã Tokugawa, achou que o local não estava à altura da notoriedade de seu avô e deu ordem para que recebesse uma decoração ainda mais grandiosa. As obras foram concluídas em 1634, resultando em um design e estilo únicos. O templo de Toshogu é um dos mais visitados do país.

Como chegar

Endereço: Ibaraki-ken Nikko-shi Yamauchi 2280

Telefone: (00xx81) 0288-54-0560

Acesso: 15min a pé das estações de Nikko, das linhas Tobu ou JR

Horário: das 9h às 17h

Entrada: por 900 ienes, é possível visitar dois templos xintoístas e um budista nas proximidades

Ponto turístico de Tokyo

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Ponto de encontro de turistas de várias partes do mundo, o templo Senso-ji, também conhe­cido como Asakusa Kannon, é um ver­dadeiro cartão-postal da capital ja­ponesa, com suas lanternas enormes decoradas e o portão laqueado de ver­melho na entrada sul. Fundado no século 17 em homenagem a Kannon, a deusa da Piedade, o templo budista tem seus portões guardados pelos deuses Raijin, deus do Trovão, e Fujin, deus do Vento, no Portão do Trovão, ou Kaminari-mon. Ao norte do Asakusa Kannon, está o portão Hozo-mon. Guardiões dos tesouros do templo, sutras chineses do século 14, são ainda mais imponentes que os do Portão Kaminari-mon.

Como chegar

Endereço: Tokyo-to Taito-ku Asakusa 1

Telefone: (00xx81) 03-3842-0180

Acesso: estação de Asakusa, das linhas de metrô Toei Asakusa ou Ginza

Horário: das 6h às 17h

Entrada: gratuita

23
nov
08

O Yoroi – A armadura samurai

Talvez a imagem mais conhecida do “bushi”, como é chamado o guerreiro medieval japonês, é a do samurai vestido com uma rica armadura, colorida e ornamentada. Ao contrário de sua congênere européia, de aspecto gótico e pesado, a “o-yoroi”, um dos nomes pelo qual é denominada a armadura japonesa, não parece ser óbice aos movimentos do “bushi”. A riqueza de materiais com que suas partes são produzidas e o esmero com que foram construídas lhe conferem ao mesmo tempo flexibilidade e resistência. As armaduras antigas, produzidas antes do século XVI, eram chamadas de: o-yoroi, kachu, haramaki, do-maru etc. Já as produzidas após este período, eram geralmente conhecidas como gusoku.

Pelos textos japoneses sobre a armadura japonesa, principalmente na parte em que se orienta a forma exata de sua composição, tal como a maneira correta de sua vestimenta, observa-se que o “bushi” começava vestindo a tazuna ou fundoshi (roupa de baixo), de preferência de linho branco ou algodão, sendo esta forrada ou não, de acordo com a atual estação.

Os Bushi de alta patente vestiam robes suntuosos por cima da roupa de baixo, como os vários Yoroi hitatare. Os bushi de classe inferior vestiam apenas a roupa mais funcional, chamada hadagi.

Por cima disto, vestia-se a roupa “shitagi”, que lembrava o kimono do dia-a-dia, preso à cintura pela obi – faixa que era enrolada duas vezes em volta do corpo e amarrada na parte da frente, sendo que alguns a preferiam amarrada nas costas.

Este último método não era recomendado pela maioria dos veteranos, porque era difícil amarrar a obi sob a armadura, se ela se afrouxasse no campo de batalha.

Por cima, o bushi de patente de atendente do marechal, “kyushu” ou “kosho”, vestia uma calça cerimonial típica ou “hakamá”. A maioria dos bushi vestia um par de “hakamá” similar, mas um pouco menor e mais curta, chamada de “Kobakama”.

Os guerreiros de classe mais baixa vestiam uma versão menor delas, chamada de “matabiki”, geralmente enfiada por debaixo da camisa.

Os bushi então vestiam um par de “tabi”, com uma divisão para o dedo maior.
Elas eram feitas de algodão (Mobien tabi), ou couro curtido (Kawatabi).

Por cima, geralmente vestia-se a “Kiahan” ou “habaki”, que vestia a parte referente à canela, e era feita de linho ou algodão forrado ou não.
Eram geralmente amarradas na panturrilha para impedir a fricção contra a proteção que se vestia sobre ela. Nós pés, o bushi de nível mais alto vestia uma espécie de sandália de pele característica, forrada com seda ou brocado, de nome “kegetsu”, “Kutsu” ou “Tsuranuki”. Possuía solado de couro grosso e o lado superior de pele de urso. Existiam vários estilos e modelos dessas sandálias, mas não mantinham relação com a patente ou nível hierárquico.

Clássicos como o “Gempei seisuiki”, por exemplo, nos dizem que “quando Kuro Yoshitsune, durante a guerra contra Kiso Yoshinaka, foi ao palácio Ho-o, ele vestiu ‘kuma no kawa no tsuranuki’, que são sandálias de pele de urso”. E os que o seguiam, vestiam sandálias de ‘ushi no kawa’, que eram feitas de couro de vaca.
Em períodos posteriores, guerreiros de patente menor vestiam sandálias “waraji”, de vários materiais como cânhamo, talos de mioga, fibras de palma e algodão.
Usualmente levavam um par extra na cintura.

Seus oficiais geralmente vestiam sandálias feitas de pequenas lâminas de couro ou ferro. As pernas, do joelho até o tornozelo, vestiam proteções chamadas de “sune ate” ou “shino zutsu”, geralmente moldadas em ferro ou couro na parte da frente e atadas atrás. Algumas peças eram feitas apenas de metal.
Em tempos antigos, cavaleiros montados costumavam vestir estas proteções com uma lâmina na parte de trás, para proteger contra ataques de espadas ou alabardas.

A maioria destas proteções, contudo, era feita de lâminas longitudinais dobráveis com as lâminas centrais cobrindo o joelho.
Todas geralmente incluíam uma proteção de couro “abumi zure” na parte de dentro para proteger contra o atrito. O joelho geralmente era protegido por uma espécie de cuia de metal abaulada que se chama “hiza yoroi kakuzuri”, que era parte integral da armadura ou uma peça separada.
Existem duas variedades desta espécie de joelheiras: yamagata e Juwa ga shira.

A parte superior das pernas era protegida pelo haidate, peça semelhante a um avental, sendo que a parte de cima era geralmente coberta com lâminas pequenas – Kozane – feitas de ferro, couro ou osso de baleia.
Esse avental partido no meio era esticado com cordas chamadas tsubo-no-o, que eram enroladas na cintura e amarradas na parte da frente.
Manuais antigos recomendavam que, para remover o avental quando se atravessava um rio ou pântano, era recomendado que se amarrassem as cordas do lado de fora do “Do” – parte que protege o tronco.
Havia outros tipos de proteções do quadril do guerreiro, assim como nos guerreiros europeus, que eram feitas com lâminas de metal enlaçadas com cordas de couro e seguras com uma pesada trama de seda ou couro chamada de “ita-haidate”.
Outras, construídas com lâminas de metal menores e mais leves amarradas com seda e chamadas de “igo-haidate”, eram preferidas pelos guerreiros montados, por serem mais flexíveis que o modelo usual.
Uma peça de armadura usada pelos homens da infantaria nos tempos de guerra, ou pelo bushi sob suas calças em tempos de paz, era chamada de “kussari kiahan” ou “kiahan suneate”, e cobria a perna inteira. Armadura do Período Momoyama

O guerreiro então vestia luvas – “yugake”, feitas de pele, e de preferência não-forradas e às vezes com um pequeno buraco na palma da mão.
Sobre elas, para proteger seus braços da mão até o ombro, ele vestia mangas justas feitas de seda, couro ou um outro tecido que tivesse consistência, cobertas com lâminas adicionais de metal.
A manga da armadura, chamada de “Kote Tegai” era protegida principalmente do lado externo por uma série de metais, que começava por uma lâmina “Kamori Ita”. Ela cobria o ombro sob a outra proteção da região, chamada de “sode”.
Duas cordas pesadas atavam a lâmina de cima ao peito e uma terceira atava a outra manga da armadura.

A parte superior do braço era protegida por outra grande lâmina de metal – a “gaku no ita” – enquanto o cotovelo era coberto por uma lâmina circular e côncava – “hijigane”.
O braço também era protegido desde a altura do cotovelo ao pulso por uma longa lâmina “ikada” ou por uma série de tiras de metal longitudinais. Às vezes, ela se apresentava encaixada em uma só peça de metal, furada e moldada, à qual era atada ao pulso uma outra peça que tinha por função proteger as costas da mão.
Essa peça era forrada com couro e possuía uma curvatura de forma que se ajustasse aos dedos do guerreiro. Nas armaduras antigas, peças para os dedos e anéis eram acopladas umas às outras por uma pequena corrente. Mais tarde, pesadas luvas de couro eram vestidas.

A porção interna do braço, que requeria menos proteção que a área externa, era coberta com um tecido pesado, ou o próprio couro, entremeado com seda ou tiras de couro. Entretanto, sua defesa era mais baseada nas habilidades do guerreiro de que propriamente pelas peças da armadura, uma vez que essa área se tornava exposta quando os braços eram levantados para aplicações de golpes com a espada.
Existiam técnicas que se tornaram famosas no Yari Jutsu e no Kenjutsu por visarem atingir essas áreas expostas e vulneráveis da armadura contra adversário em combate.

Havia uma quantidade fantástica de tamanhos, tipos, formas e materiais que o bushi podia selecionar para essa importante vestimenta. Um exemplo são as mangas da armadura coberta por uma malha feita de anéis e correntes de metal (kusari gote). Os braços eram, em seguida, protegidos por placas (tetsu gote). Havia um tipo de manga que protegia o braço cobrindo-o com uma larga placa (como um sode adicional), atada ao ombro (tsugi gote). Outras eram formadas por escamas sobre o bíceps (gaku no ita); outras ainda alternavam faixas dessas placas com a malha de metal (oshi no gote), ou eram totalmente feitas da malha à qual eram amarradas fortes placas de vários tipos (shino gote, echu gote, awase gote).

Ele também usava uma pequena proteção para o antebraço, coberta com as placas e malha, e depois com um tecido rústico (hansho gote). Essas mangas eram muito específicas de acordo com o tipo de propósito marcial desejado. Por exemplo, havia mangas especiais (yu gote) feitas de seda e brocado, sem qualquer proteção pesada, que eram vestidas aos pares, a partir dos ombros. Eram mais utilizadas pelos arqueiros, que precisavam de liberdade de movimentação para manejar seus arcos e flechas. Em certas ocasiões, os arqueiros usavam apenas uma dessas mangas, para proteger o braço direito, ombro e boa parte do peito e costas. Eram atadas em volta do corpo. Muitas das mangas de armadura consideradas leves eram usadas em tempos de paz, sendo vestidas sob o quimono, quando o bushi deveria estar preparado apenas para confusões de rua.

As articulações, que geralmente ficavam desprotegidas devido ao vão existente entre as mangas protetoras (kote) e as placas laterais (watagami) do corselete (do), eram reforçadas com camadas de malha de metal, placas e escamas (waki biki). Eram vestidas sob o corselete, separadamente ou ligadas umas às outras por uma faixa de metal (kusari waki biki). Podiam ser apertadas com botões (botan gake), ganchos (kohaze gake) ou cordas (himo tsuki). Um tipo especial de equipamento (manju nowa) combinava os waki biki com um colar e ombreiras.

O elemento central de uma armadura em qualquer país (junto com o capacete, claro) é o protetor de peito (do). No Japão, o estilo desses dois elementos representou e identificou a armadura de vários períodos da história do país – o pré-histórico (tanko, kachu, kisenaga), o antigo (yoroi) e o moderno (gusoku). A maior parte do corpo do bushi era vestida com um corselete feito de largas placas de metal, como os antigos corseletes (kaki yoroi, keiko) do século IV. Havia também corseletes de couro brilhante, forrados e cobertos com faixas de escamas bem atadas com seda ou cordas de couro. Como foi notado anteriormente, o couro era matéria-prima preferida dos confeccionadores de armaduras, e os vários tipos de couro utilizados, assim como os vários tipos de tratamento, originaram uma série de corseletes (kawa tsutsumi), assim como os de couro chinês (kara kawa tsutsumi), couro vermelho (aka kawa tsutsumi)e couro florido (hana gawa tsutsumi). Muitos dos corseletes das classes mais baixas eram feitos de couro preto (sewari gusoku). As placas que o cobriam, por sua vez, utilizavam pele de tubarão (same tsutsumi), casco de tartaruga (Moji tsutsumi) e osso de baleia, criando belas texturas e dando grande resistência à vestimenta.

Havia uma variedade aparentemente infinita de corseletes em uso no Japão em diversos períodos, e eles são divididos em duas categorias principais: a primeira e mais comum engloba as peças compostas por placas ou escamas e amarradas com fortes cordas (do), e a segunda, das peças inteiriças. Os mais recentes, chamados de placa “peito de pombo” (hatomune do) ou placa “peito de santo” (hotoke do), porque simulavam a curvatura do corpo humano, eram muito raros. Cobrindo o corpo do pescoço à cintura, eram usados no Japão dos séculos XVII e XVIII. Aparentemente copiados dos modelos europeus, podiam ter a abertura nas costas, ou nas laterais. Os que possuíam abertura frontal eram pouco comuns. Adotados pelas categorias mais baixas de samurais e seus ajudantes, certos modelos ajustáveis mais simples possuíam inúmeras derivações.

Alguns modelos incluíam dois soquetes aos quais era presa a bandeira da cavalaria. Os samurais de alto escalão vestiam peças adicionais, como a importante “se-ita”, ou “se-ita no yoroi”, que eram placas pequenas que protegiam as articulações dos ombros e parte superior do braço.

As mais antigas eram geralmente feitas de metal ou couro bem grosso, ricamente decoradas com detalhes em metal nas bordas. As mais recentes eram feitas com três placas grossas ou fileiras de escamas sobrepostas, protegidas com couro curtido. Nos últimos corseletes fabricados, os samurais de baixo escalão – que não eram autorizados a vestir as placas protetoras, vestiam proteção menores chamadas de “giyo yo ita”. Eram vários os modelos existentes dessa peça específica.

Em volta da cintura, o bushi vestia um cinto (uma-obi) feito de linho ou tecido, com ornamentos na frente. Quando ele cortava as pontas desse cinto e jogava fora a bainha de sua espada, que ele geralmente carregava presa ao cinto, sua intenção de morrer no campo de batalha era claramente manifesta aos seus inimigos e a natureza desesperada de sua luta era enfatizada.

Os ombros do bushi dos altos escalões eram protegidos nas laterais por duas grandes e características proteções (sode), cada qual feita de pequenas escamas arranjadas em várias faixas, firmemente amarradas com corda de seda, sobre um forro de metal ou couro. A escama do topo em ambas era sempre de metal maciço, fundida e ricamente decorada. Essa peça da vestimenta variava muito de acordo com a posição do guerreiro.

Uma outra placa adicional era amarrada em volta do corpo para proteger tanto o peito como as costas do indivíduo. À esquerda da vestimenta, o bushi punha então o suporte para qualquer tipo de espada que preferisse (koshi ate), para portar suas duas espadas (daisho), tanto a pequena ‘wakizashi’ como a longa ‘tachi’. Em tempos mais antigos, uma espada adicional era carregada, chamada ‘nodachi’, geralmente maior e mais pesada que a ‘katana’ original. A ‘nodachi’ era carregada nas costas.

Seu uso, que já havia sido universal em campo de batalha, tornou-se raro durante o período Tokugawa.

O pescoço do bushi era protegido por uma espécie de colarinho frontal (nodowa) feito de escamas ou pequenas peças firmemente amarradas juntas em forma de U. Essa peça parece ter sido elaborada no século XVI a partir de um colar antigamente vestido sob o ‘do’ e amarrado a um suporte chamado ‘eri-mawari’. No período Tokugawa, entretanto, era vestido sobre a armadura em uma grande variedade de estilos.

Bibliografia: Ratti, Oscar. Segredos do Samurai, As artes marciais do Japão Feudal. 1973

16
set
08

Entrevista com Hitohiro Saito

por Sonoko Tanaka
Aikido Journal #113 (1998)
Traduzido por Christiaan Oyens
Este artigo foi preparado graças a assistência deVolker Hochwald da Alemanha.
“Não devemos romper com a tradição do fundador apenas porque pessoas chegam do exterior.”
Hitohiro Saito (40) nasceu em Iwama, onde iniciou sua prática de Aikido aos sete anos. Ainda criança estudou com Morihei Ueshiba e depois continuou aprendendo com seu pai, Morihiro Saito Shihan. Dedicado a preservar a tradição espiritual e técnica do aikido de O-Sensei, Hitohiro criou sua reputação pela excelência de sua técnica e seu método de ensino no Japão, Estados Unidos, Europa e Austrália. Pudemos sentir seu amor intenso e profundo respeito pelos seus dois mestres (o fundador e seu pai) durante esta entrevista exclusiva.

Hitohiro Sensei, quais são as suas primeiras memórias do dojo?
Eu dividia as refeições com O-Sensei e me davam o que sobrava do seu prato. Eu também me lembro que chorava de manhã durante a minha infância porque não encontrava a minha mãe do meu lado ao acordar. Ela estava sempre no dojo ajudando O-Sensei.

Dizem que O-Sensei era muito severo?
O-Sensei em geral só demonstrava suas técnicas nos outros lugares, mas ele instruía de verdade em Iwama e era muito rigoroso. Ele gritava, “Que tipo de kiai é esse! Vá lá fora e veja se consegue derrubar um pardal com o seu kiai”. Ou a alguém aplicando um yonkyo fraco, “Vá lá fora e experimente aplicá-lo numa arvore! Mantenha a chave até descascá-la!”.
Mesmo quando criança, eu percebi pela atmosfera que o rodeava que se tratava de um grande homem. Nós curvávamos nossas cabeças em reverência desde o momento que Saito Sensei, meu pai, ia buscar O-Sensei, e permanecíamos prostrados até a chegada de O-Sensei com o Saito Sensei vindo logo atrás. Finalmente, levantávamos nossos rostos para junto com O-Sensei fazer a reverência frente ao santuário do dojo. Aí, iniciávamos a pratica com tai no henko.
Se eu sentava ao lado de Saito Sensei enquanto O-Sensei explicava uma técnica como shomenuchi, me mandavam executar o shomenuchi em O-Sensei. Um dia, a minha irmã mais velha foi instruída a ir atacar O-Sensei, mas ela começou a chorar e saiu do dojo já que não era fácil para uma criança ir e interromper O-Sensei desta maneira. Mandaram que eu fosse em seu lugar e ataquei com um grito de kiai, aí O-Sensei comentou, “então você veio?” Ele me arremessou, mas usou sua mão para me proteger e evitar que a minha cabeça batesse no tatame, e disse, “tenha cuidado.” O-Sensei era uma pessoa muito boa.
Me lembro de um dia ir para o jardim e observa-lo escovar os dentes, quando de repente ele os removeu, como eram falsos, e disse, “isto foi engraçado, não?” (risos)
Quantos anos tinha na época
Na época freqüentava o segundo grau. O-Sensei era vigoroso na época. Durante os seus últimos anos fazia longos aquecimentos, mas na época que iniciei o Aikido ele ensinava um numero maior de técnicas.
Quando decidiu se dedicar completamente ao Aikido?
Não tive muita escolha, já que eu era o único filho, mesmo que eu fosse muito preguiçoso quando o assunto era treinar. (risos) Tinha planos de abrir um restaurante para ganhar a vida enquanto fazia Aikido. Depois do secundário, fui para Sendai durante um ano onde estudei cozinha. Depois fui para Osaka por mais dois anos de estudo. Sempre que tinha folga, eu visitava o dojo de Seiseki Abe para estudar caligrafia com ele. Também visitava o aiki dojo de Bansen Tanaka.
Abe Sensei pratica o misogi ao se derramar com água fria todo manhã para purificar sua alma. Ele parecia expressar uma mente ascética através de sua caligrafia. Originalmente ele conheceu O-Sensei no dojo de Bansen Tanaka em Takahama. O-Sensei criou afinidade com ele no caminho do misogi e começou a estudar caligrafia com ele.
Visitamos Abe Sensei alguns anos atrás e vimos alguns manuscritos incríveis de O-Sensei. Você sente uma atmosfera espiritual assim que entra no dojo.
Esses manuscritos são iluminados, não são? Para aprender mais sobre O-Sensei devemos ler seus dokas (poemas) e estudar sua caligrafia. Fotos e vídeos nos criam um senso de ligação com O-Sensei, mas seus poemas e caligrafia nos comunicam aspectos mais sutis. São realmente profundos e maravilhosos.
Abe Sensei conhece bem os poemas de O-Sensei, não é?
Isso mesmo. Eu espero que ele consiga realizar seus planos de publicar uma coleção da caligrafia de O-Sensei e a construção de um museu dedicado a O-Sensei. Durante a minha infância, Abe Sensei visitava com freqüência Iwama acompanhado de sua filha. É um homem dedicado ao estudo com um profundo conhecimento do Kojiki (Registro sobre Assuntos Antigos), o livro mais antigo da historia japonesa, livro que O-Sensei citava ao explicar o Aikido. Abe me falava muito sobre o Kojiki, mas como era tão complicado, temo que as explicações entravam por uma orelha e saiam pela outra. (risos)
Treinou aikido durante seu aprendizado em Sendai e Osaka?
Em Sendai, treinei com Hanzawa Sensei, e em Osaka, pratiquei no dojo de Abe Sensei.
Abriu um restaurante em Iwama como planejado?
Sim, em 1978, mas eu era jovem e tolo e costumava beber com os fregueses à noite e não treinava com seriedade. Operei o restaurante durante sete anos, mas fiquei preocupado com a minha saúde, então falei com o meu pai e ele concordou que eu deveria abandonar este negócio. Ele viajava com freqüência para o exterior e precisava de alguém para administrar o dojo em sua ausência. Isto foi há onze anos, e desde então ensino Aikido em tempo integral.
Onze anos atrás acompanhei Saito Sensei para a Dinamarca e participei ali de um seminário. Ano passado marcou o décimo aniversario desta viagem, então fui novamente com Saito Sensei e várias pessoas de Iwama. Foi um grande seminário com mais de 300 participantes.
Que conselhos daria para os estudantes do Aikido sobre os princípios de treinamento?
Saito Sensei diz que todas as técnicas de taijutsu (sem armas), ken e jo são baseadas em hanmi. Aí, você tem que aprender a usar o kiai corretamente. Acho que treino sem kiai é inútil. O Fundador tinha um kiai maravilhoso. Se você quer aprender o verdadeiro budo, não terá nada a perder sempre que tentar imitar O-Sensei. Infelizmente, os praticantes não sabem muito sobre O-Sensei, portanto faço o possível para contar-lhes sobre ele.
O fundamento do treino de Aikido é o ato de se forjar. Você não pode fazer isto se desde o início de seu treinamento praticar ki no nagare (técnicas de fluxo de ki). O treinamento básico consiste em permitir que o seu parceiro o segure com vigor. Fazendo isso, ele estará lhe fazendo um favor. Seu parceiro primeiro segura firme, aí sim você pratica uma técnica. Uma das instruções do Fundador era de começar como tai no henko. Você não deve negligenciar nem uma vez a prática de tai no henko. Isto é o que ensinamos em Iwama.
É de suma importância treinar com afinco tai no henko e morotedori kokyuho. De outra maneira, não se pode nem tentar explicar ikkyo. Quando você pivota com o pé da frente e abre um espaço atrás, como em urawaza, você deve ser capaz de executar o movimento correto de tai no henko, que é apenas fazer com que os dedos do seu pé se alinhem com os dedos do pé do seu parceiro. Seu corpo pivota sobre o seu dedão do pé. Você deve pivotar de forma equilibrada, não de qualquer maneira. Você tem que se harmonizar de forma precisa com o seu oponente, e não de forma desajeitada. Você tem que ter esta segurança desde o início.
É um ponto de vista valido; a precisão necessária para se harmonizar.
Qualquer um pode se harmonizar, num modo geral, mas ele deve começar com formas mais específicas que irão, no final das contas, expandir para a harmonia universal que o Fundador citava. Primeiro você aprende a se fundir com o parceiro “dedo a dedo” (dos pés), depois a pivotar com seu pé da frente. Quando você aprender a pivotar corretamente, você irá conseguir executar uma técnica urawaza. Ninguém pode expressar isto verbalmente, isto só pode ser dominado treinando. O Fundador dizia, “O treino vêm em primeiro lugar.” Não é que o seu parceiro se harmoniza com você, mas que você irá se harmonizar com ele em tudo. “Mexa-se, abra um espaço e tome a iniciativa.” Isto foi o que o Fundador ensinou para o Saito Sensei. Um erro de um centímetro pode impossibilitar uma técnica de ser usada com sucesso.
Você não pode mudar as técnicas ao seu agrado. Há uma maneira correta de executar cada técnica. Qualquer pessoa – não apenas os fisicamente fortes – deve poder aplicar as técnicas. Infelizmente, muita gente negligencia tai no henko. Posso dizer apenas observando as pessoas praticando tai no henko e morotedori kokyuho, como praticam em seus dojos. Não preciso ver mais nada. Creio que todos os básicos do taijutsu do Fundador estão presentes nestas duas técnicas e em ikkyo. É difícil encontrar alguém que execute uma técnica ikkyo com perfeição. Sei que isto pode soar um tanto insolente, mas eu acho que você não pode entender o Aikido sem desde o início se familiarizar bem com estas técnicas. Se você não dominar tai no henko, você sempre irá se chocar com seu oponente executando outros movimentos. O treinamento básico permite que você resolva problemas causados por movimentos corporais mal executados. Isto é impossível explicar com palavras, já que seu significado é muito profundo, mas acredito que a única maneira de aprender é permitindo que o seu parceiro lhe segure de maneira firme.
Em alguns dojos, os professores demonstram as técnicas duas ou três vezes e pedem para que seus alunos as treinem sem maiores explicações, mas em Iwama, o senhor sempre dá explicações detalhadas.
A razão pela qual Saito Sensei explica suas técnicas detalhadamente é porque ele gostaria que seus alunos aprendessem as técnicas o mais rápido possível. Seu método de ensino é resultado dos inúmeros erros que ele fez ao longo dos anos e o que ele conseguiu aprender deles. Nos seus últimos anos, O-Sensei demonstrava suas técnicas com a velocidade de um flash, assim julgaria depois as habilidades de seus alunos e o quanto eles conseguiam entender das técnicas. Como o Saito Sensei quer que todos melhorem com mais rapidez do que ele teve oportunidade, ele interrompe seus alunos imediatamente quando estes fazem algo errado e os corrige em cada detalhe. Ele não seria capaz de fazer isto se ele endossasse treinos fáceis. Se o seu parceiro cede às suas técnicas o tempo todo, você não irá saber se as está executando corretamente. Ao segurar com força, o seu parceiro está lhe ajudando a entender se está executando as técnicas de forma correta, ou não. Isto não quer dizer que ele deve segurá-lo de maneira torpe ou agressiva; embora em tais casos, a técnica pode ser adaptada para lidar com estas situações também. Seu parceiro deve segurá-lo de maneira firme, porém correta, aí você pode se alinhar com esta força. Isto é o treinamento básico. Se ele assume uma pegada invertida por cima, ou por baixo, você deve adaptar sua resposta da maneira adequada. Quando o seu parceiro vier agarrá-lo, conduza-o com habilidade. Vocês estão se doando fisicamente para treinar com seriedade.
As pessoas tendem a dizer que no Aikido você não consegue avaliar a sua habilidade porque o seu oponente está sempre colaborando com você.
Isto não é verdade. Você sempre pode ter uma dimensão da sua técnica e se ela funciona, cada momento que estiver praticando. Se tiver que fazer um esforço desnecessário, sentir que o seu parceiro está pesado, ou entrar em choque com ele, isto acontece porque não está se harmonizando completamente com ele. Você deve ter a capacidade de identificar com precisão o que há de errado com seu movimento, ou se você não abriu suficiente espaço. Não existe a necessidade de torneios para saber se as técnicas funcionam ou não.
O senhor quer dizer que seu parceiro deve atacar com seriedade durante os treinos?
Sim. Se eu digo, “Empurre com força”, ele deve empurrar com toda força; se eu digo, “me dê um soco”, ele deve me golpear com força; ou segurar com força. Ele deve me atacar com toda sua força e energia. Claro que se a força de uke for muito maior do que a do seu parceiro, ele deve atacar com metade da força para que nage possa aprender. O Fundador afirmava que praticar com crianças era uma ótima maneira de aprender. Se harmonizar completamente com a energia de uma criança é um grande desafio. É evidente que algumas pessoas são mais fortes do que outras, mas se elas agridem seu parceiro, estão apenas cometendo um ato de violência que não tem nada a ver com o Aikido. Algumas pessoas pensam que treinar de forma violenta tem seu valor, mas eu acho isto lamentável. O Fundador disse que nós devemos nos divertir treinando, mas isto depende de como você emprega esta diversão. Ao dizer para seu parceiro no término da aula, “Muito obrigado. Por favor, treine comigo outra vez”, esta é a melhor maneira de se treinar. Se surge conflito entre você e o seu parceiro durante o treino e este mal estar permanece até a conclusão da aula, este tipo de treinamento não pode conduzir à paz mundial, que era justamente o objetivo do Fundador. Quero que as pessoas desfrutem todas as minhas aulas. Mesmo que uma pessoa com alguma contusão tenha vontade de treinar. Eu aconselho os meus alunos a avisarem seus parceiros se estão com alguma contusão no cotovelo ou pulso. Eles ainda podem treinar com o outro braço. Digo às pessoas que sofrem de dores nos joelhos para treinarem as técnicas em pé, em vez de sentados. Não devemos treinar de forma negligente. A melhor maneira de se treinar é quando os parceiros se respeitam. O fundador pregava uma abordagem sem preconceitos e em Iwama você ainda irá se comover com este tipo de sentimento. Ele também dizia que você pode aprender com tudo que observar, desde que você queira. Isto é a mais pura verdade.

24
ago
08

As Origens da Artes Marciais Tradicionais – Kobudo

Alguns estudiosos estimam que as escolas tradicionais de artes marciais japonesas, referidas como ryuha, tiveram início no final do período Heian. Contudo, estes sistemas de combate não se especializaram em um tipo particular de arma, como arco, espadas, lanças, etc. Ao invés disso, buscaram um currículo abrangente que integrava treinos de diferentes armas. Ao longo do tempo as escolas se compartimentalizaram e por volta do período Muromachi ao período Edo , surgiram aquelas onde os guerreiros podiam se devotar a treinos ascéticos de apenas uma arma em especial. Entretanto, as escolas dedicadas ao Kyujutsu (Arco e Flecha) e Bajutsu (Equitação de Guerra) remontam a épocas anteriores a esta compartimentalização. A partir do século XV percebe-se o florescimento de estilos de Kenjutsu (Arte da Espada), Sojutsu (Arte da Lança) e Jujutsu (Arte da Imobilização do Oponente), porém estes não se estabeleceram como Ryuha até a Era Keicho (1596-1615).
Kashima e Katori são bem conhecidas como sendo importantes regiões de onde as escolas tradicionais de artes marciais surgiram. Situadas no mesmo lado da região Otone, na parte Leste do Japão, ambas, Kashima Shrine e Katori Shrine são lugares sagrados onde divindades associadas à destreza e bravura militares são reverenciadas. Logo, é natural que as artes marciais japonesas tenham tradicionalmente florescido nestas áreas. É frequentemente dito no Japão que “as ciências militares (Heiho) vieram do Leste”, o que em essência se refere a Kashima e Katori. Artes marciais ryuha representativas da região são a Kashima Shinto-ryu e Katori Shinto-ryu.
No início do período Muromachi, um número de notáveis guerreiros criou suas próprias ryuha. Alguns exemplos são Chujo Hyogonosuke (?-1384), fundador da Chujo-ryu; Aisu Iko (1452-1538), criador da Kage-ryu e Iizasa Choisai (1387-1488) fundador da Katori Shinto-ryu, a qual foi posteriormente desenvolvida por Tsukahara Bokuden (1489-1571). Todos foram grandes guerreiros renomados por suas exemplares habilidades militares. Eles percorriam os campos desafiando outros guerreiros a fim de testar e aprimorar suas técnicas numa prática conhecida como musha-shugyo. Estas práticas, consequentemente, serviam para promover suas próprias ryuha, as quais derivaram em outras escolas que se espalharam pelo país.
Na metade do período Tokugawa, com a solidificação do sistema de territórios, os senhores de cada uma destas regiões (han) competiam para empregar hábeis instrutores de artes marciais de várias ryuha. Eles procuravam os melhores instrutores para ensinar artes militares aos guerreiros que os serviam, o que eventualmente deu origem a algumas ryuha em localidades seguras. Alguns lordes proibiam as ryuha de se propagarem fora de seus territórios, fazendo destas propriedades exclusivas. O número de ryuha proliferou enormemente, e ao final do período Edo estimava-se a existência de 52 escolas de Kyujutsu, 718 escolas de Kenjutsu, 148 escolas de Sojutsu e 179 escolas de Jujutsu (algumas eram as mesmas escolas, porém com nomes diferentes). Muitas ryuha espraiaram-se pelo Japão, entretanto, um número de filiais, facções e imitações deixaram de funcionar, restando apenas seus nomes. A despeito das questões sobre linhagens autênticas, estima-se que em torno de 500 destas ryuha tradicionais ainda existam hoje em dia.
Como se pode observar no gráfico exposto, muitas das ryuha que sobreviveram até hoje, não necessariamente vieram ou permanecem na mesma localidade em que estão situadas atualmente. Por outro lado, existem algumas ryuha cujas sucessoras permaneceram no local de origem através das gerações. Destas, as mais famosas são a Kashima Shinto-ryu, Tenshin Shoden Katori Shinto-ryu, Jigen-ryu, Takenouchi-ryu, Ogasawara-ryu Kyubajutsu, Maniwa Nen-ryu, Taisha-ryu e Owari Yagyu Shinkage-ryu. As linhagens destas ryuha são genuínas, e são celebradas até os dias de hoje como sendo representativas das escolas tradicionais de artes marciais japonesas.

( Texto original de Nippon Kobudo Kyokai – Associação das Artes Marciais Tradicionais Japonesas – coletado de The Spirit of Budo)
Tradução: Daniele Probstner. Edição Final: Walter Amorim Sensei

Mapa em alta resolução

22
jun
08

Fudo-Myo Sama

Fudo-Myo Sama

Quase a totalidade dos ocidentais desconhecem a figura de Fudo-Myo. Foi o Deus (Sama) protetor dos Guerreiros Ninjas e Samurais do antigo Japão. Estes quando partiam para uma batalha, não temiam a morte porque julgavam estar sob a proteção de Fudo-Myo. Muitos conhecem Fudo-Myo como o Deus da guerra ou dos guerreiros, e é claro que o nome pode ser mal interpretado. Na verdade Fudo-Myo simboliza o lado guerreiro de cada um. O fogo que envolve Fudo-Myo simboliza o interior do ser humano que queima, porém sem ser qualquer sentimento nefasto, representa a pureza do espírito, ou podemos até dizer que é a essência do homem. No seu rosto e corpo transparecem as emoções negativas, todavia, são para destruir vibrações negativas. Cultuando-o, você estará protegido dos males espirituais, das invejas, dos rancores e de outras energias negativas. A espada em sua mão direita é a imposição da lei universal e da proteção. A corda na mão esquerda simboliza a liberdade, pois com Fudo-Myo nos libertamos de pensamentos negativos e assim nos tornamos livres. Para os praticantes de artes marciais, Fudo-Myo é o reflexo de nosso maior oponente, nos mesmos. Para dominar os outros é necessário antes de tudo saber se dominar. No mundo atual, o ser humano, cada vez mais vai perdendo sua origem e com ela, a dignidade e o respeito. A fé, a crença em um ser supremo está se distanciando cada vez mais. Pobres homens! Se soubessem que tudo neste mundo é transição, que tudo nos é emprestado, o nosso corpo, até a nossa vida! Tanto o nosso corpo como a nossa mente devem ser tratados como um prédio em construção, onde o pilar mestre é a nossa consciência, apoiados com as vigas do saber e do treinamento. Assim deve ser interpretado Fudo-Myo.

Samurai encontrando Fudo-Myo em um bosque

10
mar
08

Aplicação do principio da arte do sabre

Por Kishomaru Ueshiba.

O caminho do aiki e o caminho do sabre são, na aparência, radicalmente diferentes. O Aikido é praticado apenas com as mãos nuas, sem armas, enquanto que a arte do sabre requer o uso de uma arma. Mas, se tirarmos a casca, numerosos pontos comuns aparecem. Faz-se referência aqui ao Kenjutsu, arte do sabre de combate e não ao Kendo que é um esporte de competição. O Aikido apresenta similitudes mais com a arte antiga que com sua expressão moderna.

Admite-se que o Aikido se aproxima mais do Judo que da arte do sabre. Isso é compreensível se se considera que essas duas formas de arte marcial são praticadas com mãos nuas, e que se nos referimos superficialmente ao passado do fundador Morihei Ueshiba, o Jujutsu desempenhou um papel preponderante na criação do Aikido. O fundador, que por muito tempo praticou o Jujutsu da escola Daitô, adaptou um certo número de seus princípios ao Aikido; e técnicas tais como a chave de punho, as pancadas, as projeções ou as imobilizações foram elaboradas a partir do Jujutsu tradicional ou de sua forma moderna, o Judô. Mas as semelhanças se eclipsam pelas diferenças. No Aikido, por exemplo, não existe equivalente à pegada da manga ou da lapela do quimono indispensável no Judô. Além da ausência de corpo a corpo e da competição, o Aikido não integra técnicas ofensivas. Não existem técnicas no solo visando imobilizar o adversário por chaves ou estrangulamentos.

Os fundamentos

Entre as numerosas semelhanças entre o Aikido e a arte do sabre, encontram-se certos fundamentos: a posição de guarda, a distância ou o espaço que separa as duas pessoas, o olhar, os deslocamentos de pés, assim como as aplicações técnicas que são espantosamente parecidas, para não dizer idênticas. Enquanto que no Judô o quimono é usado frouxo, a fim de facilitar o corpo a corpo, no Aikido como no Kenjutsu, a vestimenta padrão é o hakama, a longa saia-calça tradicional dos japoneses que oferece uma grande liberdade de movimentos quando duas pessoas se encontram face à face. O hakama é usado igualmente em Kendo acompanhado de diversas proteções. No Aikido, os iniciantes geralmente não usam o hakama. A comparação detalhada do Aikido e da arte do sabre revela apenas um pouco das diferenças. A tomada de distância (ma-ai) pode ser um exemplo disso. Na arte do sabre, a distância correta entre duas pessoas é dada pelas duas extremidades dos sabres, se enfrentando, devendo cruzar-se ligeiramente a fim de que, com um único passo, seja possível dar um golpe mortal no adversário. No Aikido, quando duas pessoas se enfrentam, na posição hanmi, as mãos simbolizando as lâminas dos sabres não se tocam, e a distância correta deve permitir um máximo de eficácia na entrada (irimi). De mais a mais, com um sabre, o princípio de base continuará o mesmo quando da tomada de distância, qualquer que seja a altura da lâmina. No Aikido, ele vai variar segundo a técnica: os dois parceiros ajoelhados, um parceiro ajoelhado e o outro em pé, ou os dois parceiros em pé; um praticante enfrentando vários adversários ou um adversário armado.

Em relação a isso, não é possível estabelecer uma equivalência escrupulosa entre o Aikido e a arte do sabre, mas como nós sublinhamos, antes, os princípios de base, os movimentos e as maneiras de aplicação apresentam numerosos pontos comuns. Essas similitudes não são obras do acaso, mestre Ueshiba tendo, desde o início desejado fazer um bom uso das vantagens inerentes à arte do sabre. Ele se esforçou a dedicar muito tempo e energia a adaptá-los para integrá-los ao Aikido.

O estudo do sabre

Desde a mais tenra idade, mestre Ueshiba se interessou pela prática do sabre. Com efeito, antes de estar totalmente absorvido pelo Daitô jûjutsu, ele empregou seu tempo ao estudo do sabre, para dominar seus princípios. Mesmo depois de ter colocado o Aikido no ranking do budo, ele gostava de praticar o sabre e o bokuto (sabre de madeira). Houve um tempo onde o Kobukan Dojo abrigava um curso de Kendo, e entre 1936 e 1940, vários membros eminentes do Yushinkan, Nakakura,Kiyosji, Haga Jun’ichi, Nakajima Gorozo e outros freqüentaram nosso dojo. Na minha juventude, o fundador me incitou a estudar a arte do sabre da escola Kashima shinto, o que demonstra bem sua profunda ligação com essa arte e o respeito que ele lhe prestava. O Aikido não faz uso de nenhuma arma, é fundamentalmente uma arte marcial que se pratica de mãos nuas, mas a mão, por exemplo, não é uma simples extensão do corpo.. falar do sabre da mão (tegatana) permite sugerir que a mão se torna uma arma que corta como o sabre. E quando a mão é utilizada como um sabre, o movimento segue naturalmente o movimento do sabre. Esse é o exemplo da manifestação concreta de um princípio da arte do sabre em um movimento de Aikido.

Shiho-nage é o exemplo disso por excelência. O princípio da técnica é calcado sobre a manipulação do sabre. Em pé, em guarda à direita ou à esquerda, o sabre é levantado para cortar em quatro, dezesseis ou oito direções. A partir das técnicas de base do Aikido, entrada e espiral, o sabre da mão projeta os parceiros em quatro, oito ou dezesseis direções. Esta técnica pode ser modulada ao infinito, segundo a situação ou urgência. Quando o ataque é um golpe vindo da direita ou da esquerda do adversário, é possível responde-lo com shiho-nage. Se o ataque consiste em segurar os dois punhos por trás, e ainda possível, a partir dessa posição, realizar o shiho-nage. Quando os atacantes agarram os ombros de um parceiro ajoelhado, esse último pode se defender com um shiho-nage qualquer que seja a situação, shiho-nage segue mais ou menos a mesma construção.

Em um primeiro tempo, o equilíbrio do adversário é desestabilizado pela entrada e o movimento de rotação. Em um segundo tempo, o adversário é levado a seguir o movimento de rotação do defensor. Para terminar, a mão esquerda ou a mão direita (algumas vezes as duas) é utilizada como um sabre, levado acima da cabeça para descer de novo a fim de projetar o adversário.

No shiho-nage, cada movimento é ditado pela vontade de utilizar a mão como um sabre. Isso significa também que a mão do adversário é percebida como uma lâmina. Se bem que nenhuma das partes esteja armada, a ação é tão intensa como se duas lâminas nuas devessem se encontrar. Shiho-nage supõe que potência e eficácia emanam da concentração do ki e que o escoamento do ki, saído da respiração-energia, se exprime totalmente a través da mão – a lâmina do sabre – em um corte preciso e poderoso. Entre as técnicas do Aikido, shiho-nage é considerada como marca do começo e do fim da prática, a perfeição em sua realização como a demonstração do domínio em Aikido. Isso é devido ao fato de que essa técnica simboliza mais que qualquer outra a relação íntima existente entre o Aikido e a arte do sabre.

Apesar de que o Aikido ser fundamentalmente uma arte marcial que não faz uso de nenhuma arma, e que o treinamento consiste o mais frequentemente a opor dois adversários de mãos nuas, existe numerosas aplicações das técnicas de base para as quais será necessário recorrer a um sabre, faca, bastão curto ou longo. Nesses casos particulares, o princípio de usar a mão como um sabre será invertido, as armas sendo utilizadas e manipuladas não mais como objetos mas como extensões do corpo.

O gênio do fundador

O que foi dito deveria ser suficiente para demonstrar a relação estreita entre o Aikido e a arte do sabre. Mas isso não nos ajuda a compreender porque o fundador integrou a arte do sabre ao Aikido. De mais a mais, é preciso reconhecer o gênio do fundador que criou o Aikido inspirando-se fundamentalmente em duas artes marciais evidentemente de natureza diferente: o Jûjutsu clássico e a arte do sabre. Sua originalidade não reside unicamente na combinação assim obtida mas igualmente na maneira de se fazer um novo budo que soube tirar do que havia de melhor dos budos anteriores.

Criando o Aikido, o fundador realizaria seu mais ardente desejo: preservar no mundo moderno a herança inestimável do budo. A fim de chegar a seu objetivo, ele ultrapassou as querelas da forma para apreender a essência de cada arte marcial, desejando vê-la reviver em um novo budo. Ele foi guiado, nesse caso, pela profundidade de busca espiritual, procurando descobrir por entre o budo uma filosofia capaz de dar a vida e de preservá-la. O coração do budo foi transformado para se tornar o coração do Aikido, o caminho da Harmonia e do amor.

Kishomaru Ueshiba

Traduzido por Maria Imaculada de Araujo Walla

19
dez
07

Vinte anos a documentar a vida de um homem

Traduzido por Pedro Escudeiro.

Poucas pessoas saberão tanto sobre a história do Aikido como Stanley Pranin. Além disso, ninguém tem sido mais importante na procura de dados precisos da história do Aikido como ele. O Aikidonytt encontrou Stanley para uma entrevista fora do Dojo de Iwama, no final de Maio, depois de uma sessão de fotografias com Saito Sensei para o seu novo volume da série Takemusu Aikido.

Como editor-chefe de Aiki News do Aikido Journal ele tem, há mais de vinte anos, documentado a vida de Morihei Ueshiba, fundador do Aikido. Stanley Pranin é conhecido pelo seu cuidado nos detalhes e precisão. Apesar da sua pesquisa, de tempos a tempos, lhe causar problemas, uma vez que as suas descobertas às vezes contradizem a história oficial do Aikido, o seu profundo conhecimento é muito respeitado por toda a comunidade do Aikido.

Qual era o seu objectivo quando iniciou o Aiki News em 1974?

O que aconteceu foi que, uns anos antes, consegui obter alguns documentos japoneses que eram uma série de um jornal que falava acerca da vida de O´Sensei. Como não havia uma tradução deles em inglês, então, com um amigo japonês traduzimos os dezassete artigos. Mostrei-os a algumas pessoas e toda a gente os queria, por isso, começámos a fazer umas cópias mimeográficas deles. Está a ver as máquinas desse tempo, e começámos a dá-los e as pessoas ficaram muito contentes. Sempre gostei de escrever e decorriam alguns eventos na área norte da Califórnia, por isso pensei, Bem, vamos fazer um pequeno boletim. Usámos os artigos de O´Sensei como a parte principal e depois algumas notícias locais daquela área. Escrevi um curto editorial e de vez em quando as pessoas enviavam alguns artigos; e por vezes vinha algum mestre japonês, fazíamos uma entrevista e era colocada lá. Começou a partir daí. Era apenas um passatempo. Era como uma forma de distribuir o que tinha vindo a pesquisar privadamente a uma audiência mais vasta.

O que considera ter atingido com o seu trabalho?

Consegui foi arranjar uma data de problemas! (Risos) Penso que mostrámos convincentemente em termos históricos que há uma grande ligação entre o Daito-ryu e O´Sensei e entre a religião Omoto e O´Sensei. Tentar removê-lo desse contexto é prestar um péssimo serviço e tornar muito difícil saber quem O´Sensei era, de que forma ele fora original e o que conseguiu atingir. Isso, e conseguimos historicamente documentar a posição de Saito Sensei dentro do contexto histórico do Aikido. Para além de ser talentoso, aconteceu que estava no local certo, na altura certa. Caso não estivesse empregado nos Caminhos de Ferro, não estaria aqui. Se tivesse um emprego de escritório das nove às cinco, e depois a sua família , nunca poderia ter treinado tão seriamente. Descobrimos algumas coisas históricas que são provavelmente interessantes só para as pessoas que gostam de detalhes. Havia uma ligação forte entre a família Inoue e a Ueshiba. Há uns setenta ou oitenta anos atrás. Há bastante tempo mesmo, isso foi muito, muito importante nos primeiros tempos do treino de O´Sensei. Eles promoveram-no e assistiram-no de muitas formas.

Como seria a história do Aikido sem o Aiki News?
Leia os livros do Aikikai e do Yoshinkan e saberá. O Doshu escreveu uma biografia de O´Sensei que foi publicada, creio que em 1977, e ficou para imprimir durante dois ou três anos. Contém bastante informação histórica importante e informação que inclui coisas da sua experiência de ser filho. Contudo, temos que nos lembrar que O´Sensei historicamente teve quezílias e desavenças com várias pessoas. Apesar de terem havido pessoas importantes a apoiar as suas actividades, ou membros familiares como os Inoue ou as desavenças com o Daito-ryu, havia uma tendência que pretendia fazer com que estas coisas nunca se tivessem passado nos últimos anos. Eles queriam basicamente não mencionar tais coisas. Podemos compreender isto do ponto de vista da natureza humana. Mas, como um historiador, se eliminarmos o Daito-ryu ou a família Inoue teremos uma concepção totalmente distorcida do que é o Aikido e de como veio a ser. Temos que pôr O´Sensei no seu contexto histórico para que possamos compreender quão grandioso ele foi ou quão significativa foi a coisa que fez criando o Aikido. O que é o Aikido? Será uma arte marcial completamente original ou será apenas um Daito-ryu repassado, o que será? Não poderemos dizer a menos que estudemos estes assuntos históricos. Não teremos bases para apreciar o que ele fez.

Fazia alguma ideia da dimensão que o Aiki News iria ter quando começou?

Não, creio que não sabia o que ia fazer. Tive um dojo durante algum tempo. Fui levado pelo facto de querer saber mais sobre O Sensei. Quando vim ao Japão pela primeira vez em 1969 comecei a procurar alguma informação e não cheguei a lado nenhum. Muito poucas pessoas quiseram cooperar comigo. Não havia quase nada também em japonês. Ninguém tinha feito pesquisa. O Sensei tinha acabado de morrer e os japoneses não pareciam levar muito a sério a pesquisa. Então, assim que me interessei e descobri algo, encontrei mais e tornou-se mais interessante e quis continuar.

Quais são os seus planos futuros para o Aiki News?

Documentar qualquer aspecto da vida de O Sensei que possa. Isso significa documentar o Daito-ryu em profundidade. Iremos publicar uma tradução em inglês da biografia de Onisaburo Deguchi este ano. Publicar o maior número de volumes desta série técnica com Saito Sensei que ele queira. Um dia gostaria de publicar uma série técnica do Daito-ryu. Há vários outros mestres que levaram o Aikido noutras direcções. Pessoalmente, não pratico os seus estilos, mas admiro e respeito estes professores. Gostaria de fazer algumas coisas com eles porque penso que o que eles fazem merece a pena. E depois, após uns anos, espero escrever uma biografia de O Sensei que vai ser séria, e uma vez que vou ser eu próprio a publicá-la não haverá um editor a dizer-me o que posso ou não fazer, ou que está muito longo ou detalhado. Farei apenas o que quiser fazer. Estou a pensar mais em quando eu morrer, o que posso deixar para trás.

Pode explicar a razão mais específica desta série de livros com Saito Sensei, para a que temos estado a tirar fotografias hoje?

Como tenho expresso nos meus editoriais ou no volume um desta série, Saito Sensei, grandemente devido a um acidente histórico, teve uma oportunidade realmente única de estudar com o Fundador em pormenor, mais do que qualquer um. Ele recebeu tanta instrução técnica directa do Fundador e como a sua mente é muito metódica, então foi capaz de classificá-la e explicá-la de uma forma que é muito, muito mais fácil de compreender. Assim, ao preservar as técnicas de Saito Sensei é a seguinte melhor coisa para preservar as técnicas de O Sensei. Não há qualquer outro mestre com quem eu possa trabalhar que saiba deste assunto com esta profundidade, que possa explicá-lo claramente ou que tenha visto O Sensei por um tão longo período de tempo e que tenha visto as alterações nas suas técnicas.

Neste momento estamos no Dojo de Iwama. Qual é a importância deste local para o desenvolvimento do Aikido, do seu ponto de vista de historiador?

É provavelmente o local onde O Sensei mais podia relaxar. Onde se sentia mais confortável nos seus últimos anos. Ele viajou para Tóquio, Osaka, Tanabe e Shingu, mas a sua casa era aqui. A sua casa em Tóquio tornou-se mais a casa do actual Doshu (Nidai-Ed.) do que a casa de O´Sensei. É claro que ele podia ficar lá, mas Iwama era basicamente o seu lar e, enquanto viajava, a sua mulher Hatsu estava aqui. Ela não estava assim tanto em Tóquio. A partir de 1942 esta era basicamente a sua casa. O Dojo manteve este sabor antigo. Não é um prédio de cimento moderno. As redondezas são muito bonitas e temos ali o Sanctuário do Aiki e para O Sensei o aspecto espiritual era muito importante. É um local muito especial e, provavelmente, depois da guerra, a única casa que O Sensei teve. Provavelmente, as pessoas de Tóquio vêem de uma forma diferente, mas é assim que eu o vejo.

O’Sensei passou a maioria do seu tempo aqui em Iwama quando desenvolveu o seu Aikido e como afirmou num dos seus editoriais o Aikido ensinado no Hombu Dojo foi desenvolvido por Tohei Sensei e pelo Doshu. Como foi possível que ocorresse tão grande diferença no desenvolvimento do Aikido?

Alguns anos atrás teria muita dificuldade em responder a esta questão. Basicamente, por falar com muitas, muitas pessoas e de ponderar sobre estas coisas durante anos e anos, cheguei a uma conclusão sobre isto. Tentei explaná-la num dos meus editoriais. Se analisarmos por quanto tempo as pessoas de grande nome estudaram com O Sensei, e por grande nome refiro-me a Doshu, Tomiki, Mochizuki ou Shioda, descobriremos que treinaram por um relativamente curto período de tempo. Devido à altura em que foram treinados , receberam alguma instrução, e depois foram enviados como professores, talvez depois de seis meses ou um ano. O próprio O Sensei ia viajando, portanto, não era como se estivessem a ter uma dieta de treino constante da parte do Mestre numa base diária. Quando vimos treinar em Iwama, Saito Sensei ensina uma ou duas vezes ao dia, excepto quando viaja. Mas naqueles tempos era como se viéssemos para aqui e depois de uns quantos meses fossemos para Mito ou Tsuchiura duas ou três noites por semana para ensinar. Numa tal situação em que estamos envolvidos no ensino, a quantidade de instrução que recebemos pessoalmente é limitada. Uma vez que a arte estava na sua infância e mais tarde por causa da guerra, a carreira de muitas pessoas que eram bastante talentosas foi interrompida. É claro que durante a guerra não se passava nada, e depois da guerra O Sensei estava aqui. Ele era já um homem idoso e estava retirado, por isso, as figuras principais em Tóquio eram Koichi Tohei e o actual Doshu. Não há dúvida sobre isso. Tohei era aquele que tinha o carisma, que era forte, treinou ainda por um tempo razoável com O’Sensei , viajou para o estrangeiro, falava inglês, escreveu livros. Era o ideal de toda a gente. Mesmo no Hombu Dojo muitos dos professores seguiram-no. Tohei Sensei estudou com o Tempukai. Portanto, muitos membros do Aikikai entraram para o Tempukai também. Ele detinha uma grande influência. Na mesma altura ele estava fora bastante, no Hawai, portanto, o Doshu e pessoas como Tada Sensei e Yamagushi Sensei tinham uma certa influência e alguns seguidores. Mas Tohei era a corrente principal. Ele era o shihan bucho, o instrutor chefe e o principal do grupo de instrutores. Depois da morte de O Sensei, Kisshomaru Ueshiba tornou-se Doshu e Tohei deixou o dojo em 1974, e veio a era do Doshu. Ele queria tornar as técnicas mais fáceis de compreender e menos estilo jujutsu, mais redondas e circulares. Agora está iniciada a gestão para o seu filho Moriteru, mas a sua influência não é O Sensei. Não é Saito Sensei ou Tohei Sensei, é o seu pai. E estão a remodelando o que é o Aikido em relação à sua imagem, penso que é da natureza humana. Contudo, está cortada das suas raízes históricas, da forma como eu vejo.

O Sensei estava consciente das diferenças que se desenvolviam no mundo do Aikido?

Temos que entender que O Sensei vivia de certa forma num mundo de sonho. Via-se a ele próprio como um veículo dos vários kami. Tohei Sensei diz, por exemplo, que O Sensei dizia qualquer coisa e os seus alunos diriam, Sensei, desculpe, não percebo, e ele diria, Não tem importância, eu também não entendo o que estou a dizer. Tohei Sensei diz isto para criticar O Sensei. O Sensei pensava só em como unificar com o universo. O seu vocabulário e o seu ponto de vista eram grandemente modelados pela religião Omoto. É uma religião Shinto, uma religião Xamanística e ele estava noutro mundo. Não estava interessado em organizações. Mesmo quando era jovem nunca organizava coisas. Deixava isso para outras pessoas. Ele estava interessado em treinar-se, fazer a sua meditação, a sua relação com Deus. Penso que se aborrecia se visse as pessoas a fazer coisas que ele considerava serem de um nível vulgar. Nos termos actuais acharíamos que ele era muito estranho ou excêntrico. E na altura ele era um ancião e depois da guerra já estava nos finais dos seus sessenta.

O que acha que vai acontecer no mundo do Aikido no futuro? Como se irá o Aikido desenvolver?

Uma coisa boa do Aikido é que está a difundir-se internacionalmente e que há pessoas que estão a trazer o seu treino de outros campos e outras ideias. Portanto, iremos encontrar o Aikido como fazendo parte de outras disciplinas. Talvez a principal parte ou talvez como complemento. Penso que certas pessoas desenvolverão o Aikido mais como um sistema de saúde. Poucos farão um estilo mais duro. Irá apenas dirigir-se em muitas direcções. Nalguns aspectos é forte, pois tem algumas figuras carismáticas e as pessoas tendem a praticar Aikido por mais tempo que outras artes marciais, porque não há competição. Há mais uma relação harmoniosa e é atraente para pessoas com um intelecto mais elevado. Se for Karate ou qualquer coisa parecida, há a tendência de serem homens novos que praticam por uns anos e depois saem. Mas no caso do Aikido, as famílias podem fazê-lo e pode-se praticar por vinte, trinta, quarenta anos e nos nossos cinquenta ou sessenta ainda podemos ter uma boa prática. Poderemos fazer um Judo competitivo aos sessenta, ou Kendo? Não muito frequentemente. Vai-se definir a si próprio e depois espalhar-se por todo o lado.

Qual é o seu conselho para todos os aikidoka na Suécia?

Façam-no à vossa própria imagem e façam o melhor que puderem. Devido ao meu carácter pessoal, gostaria de lhe adicionar outros elementos porque tenho outros interesses externos. Não é o meu papel necessariamente preservar o Aikido de O Sensei como praticante. Faço-o mais como académico. Saito Sensei tem este papel. Ele tem que cuidar da casa e do dojo de O Sensei . Ele tem a sua missão na vida. Hitohiro Sensei, o filho de Saito Sensei, tem a sua missão na vida. A minha é um pouco diferente. Eu encorajo as outras pessoas a investigar e se encontrarem alguém melhor que O Sensei que aprendam com ela. Se não puderem, pelo menos eduquem-se a vocês mesmos em saberem quem era e o que fez. Não têm que tentar fazer o Aikido que ele fazia, mas pelo menos compreendam de onde ele vinha. Então, adquiram a vossa base de seja qual for a versão de Aikido que estejam a fazer e façam algo de grandioso a partir dele.

Como se irá desenvolver o Aikido da escola de Iwama , e qual é a sua missão?

Somos uns afortunados por o sucessor de Saito Sensei ser tão talentoso e leal. Nem sempre acontece assim com os sucessores. Tenho realmente muitas esperanças. Ele vai-se expandir mais e mais, porque contém tanta essência dentro dele. Tem tanto conteúdo, que se pode passar várias vidas a estudar o estilo Iwama. Espero que não venha a haver nenhum movimento no sentido de uma estrutura organizacional rígida, porque essa tem os seus próprios problemas. Se Iwama se concentrar em preservar o Aikido de O Sensei e em disseminar a arte, e na prática das próprias técnicas, em vez de criar uma estrutura hierárquica, penso que o Aikido de Iwama estará muito bem.

Muito obrigado pelo seu tempo e pelo seu bom trabalho com o Aiki News.

21
out
07

Kashima Shinto-Ryu

por Meik Skoss
Aiki News #99 (1994)
Traduzido por Nelson Wagner Santos

Às vezes é muito difícil saber em quem acreditar ou o que pensar quando aqueles numa posição de saber não podem, ou não dão à informação exata. Um caso sobre este ponto foi quando eu comecei a perguntar para alguns de meus professores e seniores sobre os antecedentes técnicos e influências históricas no desenvolvimento do aikido. O jujutsu do Daito-ryu é sentido geralmente como a base para técnicas desarmadas, mas as técnicas de armas vistas geralmente na arte foram atribuídas a um número de fontes. A maioria das pessoas com quem eu falei o pensa que o trabalho com espadas foi derivado do Yagyu-ryu ou do Yagyu Shinkage-ryu e que o uso do bastão vieram do Hozoin-ryu. Algumas pessoas eram enfáticas em dizer que todas as técnicas no aikido eram inteiramente criações do fundador da arte, Morihei Ueshiba. Depois que eu comecei a estudar o kobudo (artes marciais clássicas) eu mesmo e me tornei familiar com as características de muitos dos koryu diferentes (tradições marciais clássicas, escolas, ou estilos das artes), eu fui muito surpreendido ao ver que as armas que treinam seqüências mais frequentemente associadas com aikido de Ueshiba se assemelharam mais claramente àquelas do Kashima Shinto-ryu. Em todas as minhas conversas com professores e seniores nos dojos do aikido onde eu treinei ou visitei, eu nunca ouvi o nome deste koryu mencionado; as pessoas com quem eu falei confessaram a ignorância ou negaram qualquer conexão, e eu nunca recebi uma explanação satisfatória.

Logo depois que eu levantei estas questões, em 1978 ou 79, eu visitei o dojo do falecido Mestre Koichiro Yoshikawa, 64º Grão Mestre do Kashima Shinto-ryu. Responderam graciosamente muitas perguntas sobre a história e as técnicas do ryu. Além disso, mostrou-me um registro das pessoas que tinham entrado no Kashima Shinto-ryu e tinham feito keppan (literalmente “selo de sangue,” assinando o registro e selando-o com seu próprio sangue como amostra de sinceridade e intenção séria) datados de antes da Segunda Guerra Mundial. Adivinhem fãs do esporte? Um dos nomes no registro era o de Morihei Ueshiba, junto com o de Zenzaburo Akazawa, seu deshi. Foi-me dito que um monte de alunos da Kobukan, incluindo Morihei Ueshiba, estudou por um período de vários anos. Mais uma vez, quando eu trouxe à tona o assunto do Kashima Shinto-ryu e sua influência no aikido, diversas pessoas do aikido, incluindo um dos instrutores mais antigos no Aikikai, me asseguraram que eu estava confundido. A única ligação que eu poderia fazer era esta: a) Eu posso ler japonês, e b) eu vi o registro com meus próprios olhos (se pode discutir com um professor e seniores em inglês sem parecer impertinente, mas é quase impossível fazer algo assim no contexto japonês). Mais tarde, eu mencionei tudo isto a Stan Pranin, editor da Aiki News, e ele tinha estabelecido isto e muitos outros detalhes contundentes não publicados previamente do treinamento de Morihei Ueshiba nas artes marciais clássicas e a influência dos koryu em cima do desenvolvimento do aikido moderno. Muito mais trabalho, entretanto, permanece para ser feito.

Kashima Shinto-ryu é uma das tradições marcial mais antiga do Japão. Seus membros seguem a história do ryu há seiscentos anos até Kuniazuno Mabito, considerando ele ser o shiso, ou o progenitor, do original Ichi no Tachi ou Kashima no Tachi. Mesmo se alguém datar a história da tradição para época de Tsukahara Bokuden (Nascido. 1489), que é considerado por membros do Shinto-ryu ser o verdadeiro ryuso (fundador), há uma linha de sucessão direta contínua que dura mais de quinhentos anos.

Kuniazuno Mabito era um antepassado direto de Bokuden. Foi indicado para o cargo de curador, ou guardião, do Grande Templo do Kashima. Uma de suas responsabilidades era a manutenção da paz e da ordem dentro dos recintos do templo (o domínio manorial do Templo pode ser uma descrição mais exata; ele é grande atualmente, mas foi um dos latifundiários principais na região inteira e de exercia grande poder). Um espadachim notável, Mabito criou um grande corpo de técnicas e de métodos de treinamento e ensinou muitos estudantes que serviram como a guarda do Templo. Seus descendentes foram os Yoshikawa Urabe. Serviram como adivinhos assim como curadores do Templo, e fornecer a segurança armada transformou-se em um de seus deveres hereditários. Bokuden nasceu nesta família, mais tarde transformando-se em um yoshi, ou genro adotado do clã de Tsukahara.

Bokuden é frequentemente citado como kensei. Traduzido literalmente, a palavra significa a “santo da espada,”, mas ela significa mais corretamente um espadachim que transcendeu as técnicas meramente físicas e penetre à essência da esgrima, um cuja arte imbuída com uma dimensão espiritual extraordinária. Bokuden aprendeu o Katori Shinto-ryu de seu pai adotivo e aperfeiçoou mais tarde suas habilidades realizando o musha shugyo (treinamento ascético do guerreiro), viajando durante todo Japão e treinando com a maioria dos expoentes hábeis, conhecidos de seu tempo. Sistematizando mais tarde o ensino das artes marciais locais da área de Kashima. Após ter recebido uma inspiração divina de Takemikazuchi-no Kami, a divindade do Templo Kashima, “kokoro arata ni koto ni atare” ([aqueles] que mantém a mente de um novato [perspectiva nova; uma mente aberta à mudança], terá sucesso [pode confrontar/negociar, lidar com] em qualquer coisa), Bokuden pegou os dois caracteres (kanjis) para o novo e suceder, junto com o nome do Templo e deu um nome formal a seu sistema: Kashima Shinto-ryu.

O Kashima Shinto-ryu foi formado durante o Sengoku Jidai (idade de estados guerreiros), quando o país inteiro estava envolvido em uma série de guerras pelos senhores feudal que disputavam o controle militar e político. Suas técnicas são baseadas naturalmente nas experiências ganhas no campo de batalha e refletem a maneira em que se luta quando paramentado com a armadura da época o domaru e o gusoku yoroi. Os movimentos são dirigidos contra ao que seriam os pontos fracos ou as aberturas na armadura, particularmente as superfícies internas dos braços e dos pés e a área entre o peitoral e o pescoço ou as coxas. Muitas técnicas incorporam o atemi, golpeando com o pomo ou as costas da arma, para nocautear, ferir ou imobilizar o oponente. Os movimentos são grandes e parecem relativamente lentos nas técnicas projetadas para combate com armadura. As técnicas para o combate quando vestidos com roupas comuns ou somente protegidas mìnimamente pela armadura foram desenvolvidas mais tarde, e são, mais rápidas, menores e imperceptíveis, e alvejam um grande número de áreas no corpo do inimigo. O aprendizado esta centralizado na espada, mas incluem a lança (yari), o bastão (Jô e bô) e a alabarda (naginata).

Geralmente falando, os kamae (posturas de combate) no Kashima Shinto-ryu são enraizados, com os pés bem separados e o corpo um tanto abaixado (mi wa fukaku atae). Isto fornece uma base contínua, estável para os movimentos em campo aberto e ajuda para movimentos poderosos. A postura psicológica ou intenção do praticante de Kashima Shinto-ryu é agressiva (kokoro wa itsumo kakari nite ari), mas o corpo é mantido em uma maneira atenta, sem brandir a espada para o inimigo (tachi wa asaku nokoshite). Expondo-se ligeiramente para eliciar um ataque ou sondar a habilidade física do oponente e o estado mental (saguriuchi), podendo derrotar o oponente utilizando suas fraquezas.

O omote no tachi é compreendido de doze técnicas executadas com o bokuto reto, como de armadura. O primeiro destes, ichi no tachi, é quase idêntico a um exercício do mesmo nome ensinado por Morihiro Saito. O Ni no tachi do Kashima Shinto-ryu tem diversos elementos em comum com seqüência de treinamento do Saito, como san no tachi, mas há um número de diferenças também. Eu acredito que as diferenças refletem os ensinamentos que Saito recebeu de Ueshiba, e é relacionado à finalidade do treinamento da espada do aikido ao contrário daquele da esgrima clássica. Em todo o caso, foi observando o omote no tachi waza do Kashima Shinto-ryu que acendeu meu interesse nas conexões entre esta tradição clássica e o desenvolvimento do aikido.

Além do omote no tachi>, há um total de dezessete técnicas no chu gokui. Embora possam ser feitos com bokuto, é executada geralmente usando o fukuro shinai, uma espada do treinamento feita de bambu rachado encerrado em um saco do couro ou de lona. Esta arma permite que os praticantes experimentem o treinamento aplicado com mais segurança, porque o impacto do shinai não causa ferimento sério. A maioria das técnicas envolve treinar de encontro a um outro espadachim, mas diversas delas envolvem respostas à lança e a alabarda. O kojo okui jukka no tachi é uma série de dez técnicas com as espadas longas e curtas, sozinhas ou em conjunto, usando espadas de metal. Se as espadas forem reais, com bordas afiadas, esta pode ser chamada como habiki; na prática, entretanto, as espadas com (sem corte) bordas rebatidas (mugito) são usadas geralmente. O Tonomono tachi é uma seqüência de doze técnicas que concentram em aspectos sutis e dos princípios da esgrima. Há oito bojutsu kata, dando ao estudante do Kashima Shinto-ryu o completo conhecimento no uso do rokushakubo (bastão de madeira de seis pés). A parcela de sojutsu (lança) do currículo contém mais de trinta exercícios, e inclui técnicas com e de encontro ao kamayari (lança com gancho, lança com barra transversal), e a naginata (alabarda), assim como o bajo sojutsu (uso da lança quando montado a cavalo). Finalmente, há vinte e seis battojutsu, técnicas de sacar a espada. Incluem técnicas simples para sacar e cortar, lidando com oponentes múltiplos, e ataques de surpresa.

Atualmente, os treinos ocorrem somente uma vez por semana durante a maior parte do ano. Em janeiro, durante a parte mais fria do inverno, entretanto, a prática é feita diariamente. Os alunos variam de meninos na adolescência a diversos homens na casas dos oitenta anos. Como são comuns com a maioria dos koryu, as licenças ao invés da graduação de Dan (dan-i) são concedidos, indicando o grau de proficiência alcançado e a quantidade do currículo que se estudou. A permissão para ensinar é dada somente após ter alcançado um determinado nível, e somente com a autorização expressa do Grão Mestre do ryu. Atualmente, quatro homens da Inglaterra se juntaram ao ryu e treinaram-no por um período de tempo considerável antes de retornar para casa. Os estudantes de Aikido interessados em aprender mais sobre as raízes técnicas de sua arte podem considerar as possibilidades de treinar nesta tradição clássica.

Copyright ©1993 Meik Skoss. Todos os direitos reservados.

Meik Skoss começou a treinar artes marciais em 1966 em Los Angeles, quando se juntou ao dojo de aikido de Takahashi Isao. Foi ao Japão em 1973 continuar treinando o aikido e o iaido de Muso Jikiden Eishin-ryu com Hikitsuchi Michio. Após mudar-se para Tokyo em 1976, Skoss começou seu estudo do jojutsu de Shinto Muso-ryu com o Shimizu Takaji, um naginatajutsu de Toda-ha Buko-ryu com o naginatajutsu de Muto Mitsu, e do Tendo-ryu com Sawada Hanae, bem como continuar a praticar o aikido no Dojo do Aikikai Hombu. Foi também nesta época que começou a trabalhar com Donn F. Draeger e acompanhou o mestre hoplologista em um número de viagens a campo no Sudeste Asiático. Em 1979 começou a estudar o battojutsu sob o Grão Mestre da 21ª geração, Yagyu Nobuharu Toshimichi do Yagyu Shinkage-ryu heiho/kenjutsu e de Yagyu Seigo-ryu. Praticou também o judo, tai-chi chuan, karatedo do estilo Goju-ryu e, além do koryu acima, atualmente treina judo, atarashii naginata e jukendo. Skoss possui a graduação de 4º Dan de aikido (Aikikai), 5º Dan de jodo de Zen Nihon Kendo Renmei, 5º Dan de Jukendo, 3º Da de Tankendo, 2º Dan de atarashii naginata, okuden mokuroku e shihan licenciado em naginatajutsu do Toda-ha Buko-ryu, e sho-mokuroku no jojutsu de Shinto Muso-ryu. É um dos inúmeros hoplologistas que continuam o trabalho de Donn F. Draeger e viajou por todo o Japão para visitar muitos koryus e os dojos modernos de budo para coletar as informações em artes marciais japonesas. Atualmente reside em New Jersey, e com sua esposa ensinam o jojutsu, o kenjutsu e o naginatajutsu em um dojo em Madison. Pode ser encontrado no e-mail: mskoss@koryubooks.com